As  Paneleiras de Goiabeiras, assim chamadas por ser a maioria das artesães mulheres, residem no bairro de Goiabeiras, em Vitória, capital do Estado do Espírito Santo.
      Com competência confeccionam, em barro, panelas, potes, travessas, bules, caldeirões, frigideiras etc, de diversas formas e tamanhos. O processo de fabricação é praticamente o mesmo que os índios usavam quando aqui aportaram os portugueses na época  do descobrimento.

      O ensinamento, transmitido de pais para filhos, permite que a identidade cultural desta atividade seja mantida com muito poucas alterações, há várias gerações. São avós, mães, filhas e netas exercendo o mesmo ofício.
      Anteriormente, as Paneleiras  trabalhavam individualmente em suas próprias casas. Atualmente, mais organizadas, estão agrupadas na  Associação das Paneleiras de Goiabeiras, uma espécie de cooperativa.
Trata-se de um galpão onde cada uma, independentemente, produz e comercializa suas próprias peças. Sob o aspecto econômico, a renda que auferem, é significativa no contexto da manutenção de suas famílias.
      A Associação já se tornou um dos pontos turísticos da cidade, sendo visitada, regularmente, por turistas interessados em adquirir as peças e ver como as mesmas são confeccionadas.
No futuro pretendem as Paneleiras expandir as instalações montando, inclusive, um restaurante de pratos típicos capixabas.
      A principal matéria prima, o barro, é extraído na própria região, em jazidas do Vale do Mulembá. A argila, antes de ser usada, passa por um processo para "limpar" denominado "escolha", que consiste na retirada de impurezas, como pedras e restos de vegetais. Em seguida, devidamente envolta em plástico para manter a umidade, fica armazenada, descansando, por uns tempos antes de ser usada.

     
Esta pesada tarefa, que antes era feita pelas mulheres, é atualmente mais realizada pelos homens, que o fazem amassando o barro com os pés, pisando repetidas vezes, até torná-lo uniforme, consistente e com a plasticidade adequada.
      A modelagem das panelas é feita manualmente, sem o uso do torno de oleiro. A parede vai sendo levantada, com a forma desejada, usando-se a técnica de roletes ou diretamente, escavando a "bola" de argila, "puxando a panela", como dizem, através de movimentos com as mãos, tanto circulares como verticais, abaulando, arredondando, definindo o formato da peça com a ajuda de rudimentares ferramentas-pedras lisas, cascas de coco, coité (pedaço de cabaça), e objetos similares.
      Certamente a característica mais marcante das panelas é a sua coloração escura. Isto é obtido por meio da impregnação da peça com tanino, existente na árvore do mangue-vermelho-"rhizophora mangle".
Usa-se sua casca que é retirada do tronco batendo-se fortemente com um porrete de madeira. As lascas assim obtidas são picadas e colocadas de molho, em água doce, para curtir por  três dias, no mínimo.
    
Salientamos que esta prática na região não é predatória, havendo uma clara consciência de preservação por parte dos "casqueiros". Neste sentido só retiram a casca de um dos lados do tronco, em pouca quantidade, procedimento que não prejudica a árvore e o ecossistema do manguezal.
      A aplicação do tanino nas panelas é feita batendo-se, vigorosamente, com uma vassourinha embebida com o mesmo, na peça ainda quente, imediatamente após ter saído do fogo. Este processo de impregnação é conhecido como "açoite". Como resultado, o tanino penetra nos poros da cerâmica, cobrindo fissuras e tornando-a impermeável, servindo também para impedir a proliferação de fungos, que, com o correr do tempo, esfarelam o barro.
      Observe-se que a coloração escura da panela permite uma melhor concentração do calor, facilitando o cozimento e a conservação dos alimentos.

      As panelas, depois de modeladas, ficam em lugar ventilado e protegido do sol até secarem completamente. Só após é efetuada a queima, não em forno, mas em fogueiras a céu aberto. (método bastante primitivo adotado por tribos indígenas).
      O processo consiste em empilhar as panelas sobre grossas toras de madeiras, formando o que chamam de "cama", para permitir, deste modo, a circulação do ar pela parte inferior. Nas laterais e em cima, são colocados pedaços menores de madeira. O fogo é ateado em uma das extremidades, na "cabeceira da cama", que com a ajuda da ventilação natural se expande por todo o conjunto. Dependendo do número de peças, o cozimento pode  durar uma ou muito mais horas.
      Digno de nota é o fato da queima ser ecologicamente correta, já que não desmata árvores da região. Para fazer o fogo usam-se restos de madeiras, principalmente da construção civil. Apesar deste tipo de madeira nem sempre  possuir o melhor poder calorífico, o resultado final é satisfatório desde que o calor produzido seja intenso, uniforme e dure o tempo necessário.
 



 
      Para facilitar o armazenamento, são feitas panelas grandes, que são chamadas de mães, e pequenas, de filhas. Acondicionam as pequenas, dentro das grandes, formando uma "casada". Alguns modelos possuem asas, chamadas de "orelhas", que facilitam o manuseio entre o fogão e a mesa. Usa-se também apoiar as panelas em armações de ferro, quando levadas à mesa.






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